O papel positivo da vergonha no coaching e na liderança
Várias emoções estão presentes na vida humana, algumas mais fáceis de explicar do que outras. Entre essas emoções, a vergonha é uma das mais complexas e controversas. Geralmente, ela é vista como algo negativo, mas seu papel positivo na regulação do comportamento pró-social, especialmente em ambientes profissionais, é frequentemente negligenciado.
Autoconsciência e avaliação moral
A vergonha é uma das emoções autodirigidas, pois surge após avaliarmos nossas próprias ações e fazermos uma avaliação moral de nosso comportamento. Ela compartilha essa característica com outras emoções autodirigidas, como a culpa e o orgulho. No entanto, a vergonha é frequentemente associada a uma conotação negativa, enquanto seu papel positivo na regulação do comportamento é muitas vezes ignorado.
De acordo com Aristóteles, a vergonha é um sinal interno que nos pune, fazendo-nos sentir mal por fazer algo que sabemos que é errado ou não deveríamos ter feito. Esse processo ajuda a evitar que comportamentos negativos se repitam, preservando nossa reputação e status com os outros, especialmente aqueles que são importantes para nós.
Nas últimas cinco décadas, a pesquisa psicológica tem fornecido muitas evidências científicas sobre os benefícios da vergonha no trabalho, incluindo seu papel integral na manutenção das relações interpessoais e na capacidade de lidar com colegas, clientes e chefes. Embora alguns filósofos, como Nietzsche, tenham argumentado que só podemos ser livres se aprendermos a superar a culpa e a vergonha, que nos forçam a obedecer aos outros em vez de expressar nosso eu, nenhuma empresa ou sociedade pode funcionar a menos que as pessoas sejam capazes de fazer sacrifícios pessoais em prol dos outros. Da mesma forma, o movimento moderno de autenticidade tende a encorajar as pessoas a não se preocuparem com o que os outros pensam delas, o que certamente as livraria de qualquer sentimento de culpa ou vergonha. No entanto, isso resultaria em um grupo de psicopatas, narcisistas e sociopatas que não se importam em respeitar os outros, muito menos conviver com eles.
Em contraste, considere as evidências para os efeitos positivos da vergonha no trabalho e além.
Melhor desempenho
A crítica negativa dos gerentes pode aumentar o desempenho dos funcionários, pois pode despertar a vergonha. Isso pode ser surpreendente, considerando que as culturas corporativas modernas geralmente favorecem a positividade extrema, até eliminando avaliações e feedbacks de desempenho negativos.
No entanto, apontar o que os funcionários estão fazendo de errado é um pré-requisito para a melhoria. Não é surpresa que muitas sociedades de alto desempenho (como Singapura, Coreia do Sul, França e especialmente o Japão) utilizem o poder da crítica construtiva, incluindo feedbacks duros e vergonha, no ambiente educacional e profissional para incentivar altos padrões e cultivar habilidades e realizações nos outros.
Como o gênio musical japonês, Ryuchi Sakamoto, observou: “Meu objetivo é criar música da qual não me envergonhe.” O nível típico de vergonha que as pessoas experimentam em uma organização ou sociedade está diretamente relacionado aos padrões existentes nesse grupo ou sistema. Sentir vergonha de decepcionar os outros e falhar nos motiva a trabalhar mais, mesmo que isso signifique se preparar demais. Um nível moderado de síndrome do impostor também pode levar a realizações excepcionais em sua carreira.
Melhores relacionamentos com colegas
A vergonha melhora seus relacionamentos com seus colegas, melhorando assim sua reputação. Historicamente, a vergonha era frequentemente interpretada como um sentimento negativo com impacto interpessoal negativo, incluindo comportamentos de isolamento.
No entanto, nenhuma emoção (por mais desagradável que seja) poderia ter evoluído e adquirido um status universal sem ter uma função adaptativa. Como os psicólogos evolucionistas mostraram, a vergonha atua como um mecanismo de defesa contra ações que podem levar à desvalorização social. Em ambientes ancestrais, ser desvalorizado por seus pares poderia resultar em ostracismo, o que era prejudicial à sobrevivência. Indivíduos que sentiam vergonha eram menos propensos a se envolver em comportamentos que prejudicassem sua reputação ou relacionamentos dentro de seu grupo.
A pesquisa moderna contradiz diretamente essa visão, destacando o poder da vergonha como uma emoção moral que motiva comportamentos pró-sociais. A vergonha geralmente é uma tentativa de restaurar um eu danificado quando percebemos uma grande diferença entre nossas ações reais e nosso eu ideal ou moral. O resultado dessa interpretação, que é desagradável de sentir e experimentar, é exibir comportamentos restaurativos para corrigir nosso eu danificado e comportamentos de retraimento quando há um risco ou custo muito alto em se envolver em interações. Então, por exemplo, se seu chefe perceber que você está fazendo algo que não deveria ou se um de seus colegas for culpado por algo que você fez, você sente vergonha, o que o motiva a se desculpar ou compensar suas ações. Compare isso com alguém que passa pela vida sem se importar com como suas ações prejudicam ou magoam os outros. Assim como a síndrome do impostor (é melhor sentir-se um impostor do que realmente ser um), é melhor sentir vergonha quando os outros não acham que você deveria do que não sentir vergonha quando os outros acham que deveria.
Um pouco de vergonha vai longe
Assim como qualquer coisa, a vergonha é melhor
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Este artigo teve a curadoria de Otello Bertolozzi Neto. Cofundador e CEO da Galícia Educação. Coach profissional e executivo com larga experiência no mundo digital e mais de 20 anos em negócios online. Um dos pioneiros em streaming media no país. Com passagens por grandes companhias como Estadão, Abril, e Saraiva. Na Ânima Educação, ajudou a criar a Escola Brasileira de Direito e a HSM University dentre outras escolas digitais que formam dezenas de milhares de alunos todos os anos.