Furto Famélico no Direito Penal Brasileiro: Análise e Limites

Artigo sobre Direito

O Furto Famélico no Direito Penal Brasileiro: Compreensão, Limites e Aplicações

Introdução ao Furto Famélico

O Direito Penal brasileiro contempla diversas normas que visam equilibrar a ordem jurídica com a dignidade da pessoa humana. Uma das expressões mais complexas desse equilíbrio é a figura do furto famélico, um conceito enraizado na tradição jurídico-penal e que reflete discussões profundas sobre a função social da norma penal, a seletividade do sistema penal e a proteção de bens jurídicos essenciais.

O furto famélico, como variante do furto previsto no artigo 155 do Código Penal, é considerado um caso de excludente de ilicitude ou de tipicidade material, a depender da corrente doutrinária acolhida. Essa figura levanta reflexões que transcendem o mero debate técnico, instigando juristas a repensarem a aplicação da lei penal em um Estado Democrático de Direito.

Conceito e Natureza Jurídica do Furto Famélico

O furto famélico ocorre quando alguém subtrai coisa alheia móvel, geralmente de baixo valor, com o objetivo de satisfazer uma necessidade básica de sobrevivência, normalmente a fome. A jurisprudência e a doutrina brasileira admitem que, em determinadas circunstâncias, esse comportamento pode não configurar crime em razão da ausência de antijuridicidade ou até mesmo da própria tipicidade penal.

Do ponto de vista da natureza jurídica, há duas principais correntes:

– Para uma corrente, o furto famélico constitui uma hipótese de estado de necessidade (artigo 24 do Código Penal), o que o enquadra como causa excludente de ilicitude.
– Outra concepção entende que se trata de atipicidade material do fato, pois a conduta, apesar de formalmente típica, não viola de maneira relevante o bem jurídico tutelado – neste caso, o patrimônio.

Requisitos para o Reconhecimento do Furto Famélico

A configuração do furto famélico exige a presença de requisitos específicos que demonstram a excepcionalidade da conduta. São eles:

– Situação de extrema necessidade atual, como a fome iminente e concreta.
– Finalidade exclusiva de satisfazer essa necessidade essencial (e não o acúmulo de bens ou mera conveniência).
– Inexistência de alternativas viáveis e proporcionais para obtenção do bem (como pedir ajuda ou recorrer a políticas sociais).
– Objeto do furto voltado para consumo imediato, como alimentos ou medicamentos, e que não revele intenção de revenda ou aproveitamento econômico.

O descumprimento de qualquer desses requisitos pode descaracterizar o furto famélico, tornando inaplicáveis as excludentes e configurando o crime de furto comum.

Fundamento Constitucional e Princípios Aplicáveis

A admissão do furto famélico encontra respaldo em fundamentos constitucionais. A dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal) constitui o núcleo axiológico do ordenamento jurídico brasileiro. O Estado não pode punir alguém que, diante de uma carência extrema e da falência das estruturas sociais, subtrai bem de pequeno valor para sobreviver.

Além disso, são aplicáveis os seguintes princípios:

– Princípio da intervenção mínima: o Direito Penal só deve atuar como ultima ratio, quando não houver outros meios eficazes de proteção social.
– Princípio da ofensividade: exige que o fato seja efetivamente lesivo ao bem jurídico tutelado.
– Princípio da proporcionalidade: impede a punição desproporcional à gravidade da conduta.
– Princípio da subsidiariedade: reforça que outros ramos do Direito devem ser preferidos para a solução de conflitos de menor relevância penal.

A Atipicidade Material e a Bagatela

No contexto do furto famélico, muito se discute se o fato deve ser considerado atípico sob a ótica da insignificância ou da bagatela. A teoria da insignificância, consagrada pela jurisprudência brasileira, afirma que condutas que não afetam significativamente o bem jurídico não devem ser consideradas criminosas.

Para aplicação da insignificância penal, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu critérios:

– Mínima ofensividade da conduta.
– Ausência de periculosidade social da ação.
– Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento.
– Inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Embora o furto famélico possa se enquadrar nesses critérios, o foco deve estar menos no valor do bem – como ocorre nos casos clássicos de insignificância – e mais na finalidade almejada pela conduta: a preservação de um direito fundamental.

O Papel do Estado de Necessidade

O estado de necessidade, previsto no artigo 24 do Código Penal, é um importante instrumento de exclusão da ilicitude, sendo aplicável a condutas praticadas para salvar direito próprio ou alheio de perigo atual e inevitável, que não possa ser evitado por outros meios.

No furto famélico, entende-se que a fome é o perigo atual; o alimento, o bem necessário para afastá-la; e o furto, o meio utilizado na ausência de alternativas. O agente, figurando como sujeito colocado entre o sofrimento da fome e a infração penal, age sob compulsão natural de preservação da própria vida, o que justifica a exclusão do crime.

Implicações Práticas na Atuação Jurídica

O reconhecimento do furto famélico tem implicações importantes para a atuação de juízes, promotores e advogados. É necessário que cada caso concreto seja analisado com atenção, levando-se em conta as circunstâncias subjetivas e objetivas da conduta.

Advogados de defesa devem buscar demonstrar a presença dos requisitos do furto famélico, enfatizando os princípios constitucionais e os elementos sociais que levaram à prática do fato. Promotores e magistrados, por sua vez, devem observar o sistema penal como um instrumento de justiça e não de exclusão social.

Jurisprudência e Postura dos Tribunais

A jurisprudência brasileira tem reconhecido, ainda que sob variações interpretativas, o direito à desconsideração penal de atos praticados sob fome extrema. Instâncias superiores já decidiram pela atipicidade de condutas quando comprovada a finalidade de saciação imediata da fome e o reduzido valor do bem subtraído.

Os tribunais exigem análise rigorosa da finalidade do agente, da condição de miserabilidade e da ausência de dolo voltado à obtenção de riqueza ou lucros. Condutas que se desviem desses padrões tendem a não ser acolhidas dentro da excludente de ilicitude, ainda que o valor do bem seja considerado insignificante.

Críticas e Debates Doutrinários

O tema do furto famélico não está isento de críticas. Alguns autores argumentam que tal entendimento relativiza o princípio da legalidade penal e enfraquece a proteção ao bem jurídico tutelado. Há também preocupações de que a banalização do conceito possa estimular condutas desviantes sob o pretexto de necessidade.

Por outro lado, defensores da admissibilidade do furto famélico ressaltam que o Direito Penal não pode se dissociar da realidade social. Ignorar o contexto de desigualdade e pobreza extrema, segundo essa visão, seria aplicar a lei de modo formalista e insensível, contrariando os objetivos maiores da justiça.

Aspectos Sociais e Políticos

Além da esfera penal, o tema do furto famélico remonta à responsabilidade estatal na garantia de direitos fundamentais, como alimentação, saúde e moradia. O fato de que uma pessoa seja impelida a furtar para se alimentar revela falhas estruturais na promoção de políticas públicas eficazes.

O operador do Direito deve compreender que o fenômeno penal aqui analisado é expressão de um déficit na segurança alimentar, que exige soluções interdisciplinares. O jurídico, nesse sentido, não deve responder de forma isolada, tampouco repressiva, a problemas de ordem social complexa.

Considerações finais e perspectivas

O furto famélico representa um dos temas mais emblemáticos do cruzamento entre Direito Penal e Direitos Humanos. Ao reconhecer os limites da punição criminal diante da necessidade humana, o ordenamento jurídico reafirma sua vocação para a justiça substancial.

Mais do que uma questão de tipicidade ou ilicitude, a análise sobre o furto famélico convida à construção de uma dogmática penal comprometida com os direitos fundamentais, sensível às desigualdades sociais e capaz de mediar responsabilidades de forma eficaz, proporcional e solidária.

Insights Relevantes para Profissionais do Direito

– O furto famélico exige análise contextual e deve ser distinguido de outras formas de furto com base na finalidade da conduta.
– A aplicação das excludentes de ilicitude exige cuidado para não gerar impunidade arbitrária, devendo estar solidamente baseada em provas.
– O princípio da dignidade da pessoa humana deve balizar a interpretação penal em casos de extrema vulnerabilidade.
– A dogmática penal está em contínuo desenvolvimento, e atualizações jurisprudenciais devem ser acompanhadas de forma crítica.
– A atuação ética do profissional do Direito exige sensibilidade social e compreensão do papel do sistema penal na proteção de direitos fundamentais.

Perguntas e Respostas Frequentes

1. O furto famélico pode

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Este artigo foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de uma fonte e teve a curadoria de Fábio Vieira Figueiredo. Advogado e executivo com 20 anos de experiência em Direito, Educação e Negócios. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP, possui especializações em gestão de projetos, marketing, contratos e empreendedorismo. CEO da IURE DIGITAL, cofundador da Escola de Direito da Galícia Educação e ocupou cargos estratégicos como Presidente do Conselho de Administração da Galícia e Conselheiro na Legale Educacional S.A.. Atuou em grandes organizações como Damásio Educacional S.A., Saraiva, Rede Luiz Flávio Gomes, Cogna e Ânima Educação S.A., onde foi cofundador e CEO da EBRADI, Diretor Executivo da HSM University e Diretor de Crescimento das escolas digitais e pós-graduação. Professor universitário e autor de mais de 100 obras jurídicas, é referência em Direito, Gestão e Empreendedorismo, conectando expertise jurídica à visão estratégica para liderar negócios inovadores e sustentáveis.

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