Acordo de Não Persecução Penal no Processo Penal Brasileiro

Artigo sobre Direito

O Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) no Processo Penal Brasileiro

O Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) representa uma importante inovação no sistema jurídico brasileiro, inserido no ordenamento pela Lei nº 13.964/2019, mais conhecida como “Pacote Anticrime”. Este instituto visa promover maior celeridade e eficiência à persecução penal, com ênfase na consensualidade e na busca por soluções alternativas à pena privativa de liberdade tradicional.

Neste artigo, vamos explorar detalhadamente o funcionamento do ANPP no Direito Penal, seus requisitos, as consequências jurídicas do descumprimento, a posição da jurisprudência e, principalmente, a discussão sobre os efeitos da reincidência na viabilidade e manutenção de um acordo firmado entre o Ministério Público e o investigado.

Fundamentos e objetivos do ANPP

O ANPP encontra respaldo constitucional nos princípios da eficiência, da razoável duração do processo e da dignidade da pessoa humana. Sua lógica é pautada na justiça negocial, na valorização da autocomposição e na redução dos índices de encarceramento.

Ao permitir que, em crimes sem violência ou grave ameaça, o Ministério Público proponha a suspensão do processo mediante o cumprimento de condições ajustadas com o investigado, o ordenamento jurídico caminha para uma justiça criminal mais eficiente, condizente com as boas práticas internacionais.

Previsão legal

O ANPP está disciplinado no artigo 28-A do Código de Processo Penal (CPP), o qual determina os requisitos para sua propositura:

1. O crime deve ser cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa;
2. A infração penal deve ter pena mínima cominada inferior a quatro anos;
3. O investigado deve confessar formal e circunstancialmente a prática do delito;
4. O investigado não pode ser reincidente ou estar sendo investigado por crimes dolosos em determinados contextos (com análise da jurisprudência sobre o tema);
5. O acordo depende da homologação judicial.

Além disso, o Ministério Público pode impor condições, como reparação do dano, prestação de serviços à comunidade, pagamento de multa ou outras de natureza semelhante.

Reincidência e antecedentes: distinções cruciais

Um dos pontos mais debatidos quanto à elegibilidade do ANPP é a questão da reincidência. Ela é definida no artigo 63 do Código Penal como a prática de novo crime após trânsito em julgado de sentença condenatória anterior. Entretanto, é preciso diferenciar a reincidência propriamente dita de maus antecedentes.

Reincidência

Para fins penais, considera-se reincidente o agente cujo prazo entre a condenação anterior e o novo delito é inferior a 5 anos (prazo de reabilitação). A reincidência implica agravamento da pena, servindo como circunstância judicial desfavorável.

Maus antecedentes

Os maus antecedentes se referem a condenações pretéritas que não mais geram efeitos de reincidência formal, mas que ainda revelam padrão comportamental contrário ao Direito Penal. Mesmo sendo um conceito menos robusto que a reincidência, pode ser ponderado pelo juiz ao analisar a concessão de benefícios.

Consequências da reincidência no ANPP

Segundo o artigo 28-A, inciso I, do CPP, a reincidência é um impeditivo à concessão do ANPP: “não será cabível o acordo quando o investigado for reincidente”. No entanto, há entendimento doutrinário e jurisprudencial que requer uma análise mais criteriosa do tipo de reincidência envolvida, sua natureza e gravidade.

Algumas interpretações defendem que a vedação não deve ser aplicada de forma absoluta, sendo necessário avaliar o fato concreto, especialmente a natureza dos crimes anteriores e o tempo transcorrido desde a última condenação.

Efeitos do descumprimento do ANPP

Uma vez firmado e homologado o ANPP, o investigado se compromete a cumprir integralmente as condições ajustadas. O descumprimento implica a revogação do acordo e o prosseguimento da persecução penal com o oferecimento da denúncia.

O parágrafo 9º do artigo 28-A do CPP dispõe que o descumprimento injustificado das obrigações assumidas acarreta o oferecimento da denúncia, salvo se houver justificativa aceita pelas partes. Daí a importância da supervisão judicial e do acompanhamento ministerial durante sua execução.

Reincidência superveniente: pode revogar o ANPP em curso?

Uma das questões jurídicas mais relevantes surge quando, durante o cumprimento de um ANPP já homologado, o investigado comete um novo crime. Estamos diante da chamada reincidência superveniente. Em regra, para fins de elegibilidade ao ANPP, analisa-se a condição anterior ao acordo. Portanto, o novo delito não poderia revogar automaticamente o pacto antes firmado.

A jurisprudência nacional tem caminhado para entender que a reincidência superveniente não configura, por si só, causa de rescisão do ANPP, salvo se o novo comportamento comprometer diretamente as condições estabelecidas no acordo, como a confissão, arrependimento, dano à vítima ou causas que tornem incompatível a sua manutenção.

Neste contexto, o princípio da segurança jurídica e da boa-fé objetiva protege o investigado e reforça a ideia de que o ANPP não possui natureza penal condenatória, mas sim de negócio jurídico processual.

Natureza jurídica do ANPP

Há um debate dogmático relevante sobre a natureza jurídica do ANPP. Parte da doutrina entende se tratar de um negócio processual penal, com inspiração nos modelos de plea bargain norte-americano. Outros o consideram um desdobramento da justiça restaurativa, dada a ênfase na solução extrajudicial, na reparação de danos e na reconstrução de vínculos sociais.

O ponto central aqui é quão vinculante é o acordo assinado e homologado. Trata-se de uma obrigação sujeita a regime próprio e relativamente imune a causas de resolução externas, salvo inadimplemento das cláusulas acordadas.

Jurisprudência: interpretação ampliativa e garantista

A jurisprudência majoritária tem adotado posição ampla e garantista quanto à aplicação do ANPP. Os tribunais superiores entendem que sua interpretação deve ser conforme os princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, da dignidade da pessoa humana e da reeducação do infrator.

Decisões recentes apontam que a reincidência superveniente não tem o condão de revogar, de forma automática, um acordo regularmente celebrado e homologado. Isso porque o foco do ANPP é o fato anterior à instauração do processo, não situações futuras que possam comprometer o comportamento do réu.

Impactos do ANPP no sistema penal brasileiro

O Acordo de Não Persecução Penal transformou profundamente a dinâmica criminal nos juízos de primeiro grau, promovendo:

– Desafogamento do judiciário com a redução de processos penais;
– Promoção de justiça restaurativa com maior envolvimento da vítima;
– Maior celeridade na resolução de infrações penais de menor gravidade;
– Humanização do sistema penal, com alternativas ao encarceramento.

Além disso, o ANPP representa uma etapa importante no processo de amadurecimento da cultura de consensualidade no Brasil, abrindo caminho para modelos mais contemporâneos de justiça criminal.

Desafios práticos na aplicação do instituto

Embora o ANPP traga múltiplos benefícios, sua aplicação ainda encontra limitações. Entre os desafios:

– Divergências entre membros do Ministério Público quanto à propositura do acordo;
– Resistência de juízes em homologar termos sob alegação de legalidade estrita;
– Falta de uniformização na interpretação dos requisitos legais;
– Dificuldade de acesso ao benefício por pessoas hipossuficientes sem defesa técnica eficiente.

A superação desses entraves exige capacitação continuada dos operadores do Direito, elaboração de enunciados jurisprudenciais consistentes e comprometimento institucional com os fins do instituto.

Considerações finais

O Acordo de Não Persecução Penal é uma ferramenta valiosa, mas que exige amadurecimento teórico e prático. A condição de reincidência, especialmente a superveniente, deve ser tratada com parcimônia, sob pena de esvaziar o espírito do legislador e comprometer a efetividade da justiça negocial.

A análise da reincidência deve considerar diversos fatores: sua natureza, o momento de sua configuração, o comportamento posterior do agente e os princípios constitucionais que repelem soluções penais desproporcionais e automáticas.

Profissionais do Direito que trabalham com Direito Penal e Processo Penal devem estar atentos à evolução jurisprudencial e doutrinária sobre o tema, sabendo que o ANPP inaugura uma nova era de consensualidade e proporcionalidade no sistema criminal.

Insights finais

– O ANPP é uma expressão clara da tendência de desjudicialização e autocomposição no Direito Penal.
– Reincidência anterior impede o acordo, mas a superveniente deve ser avaliada com base em sua interferência nas condições acordadas.
– A jurisprudência caminha para garantir maior segurança jurídica e estabilidade das negociações processuais.
– O instituto promove benefícios à vítima, ao réu, ao Ministério Público e ao Judiciário.
– A interpretação sistemática do ANPP deve estar em sintonia com princípios constitucionais como dignidade da pessoa humana, proporcionalidade e eficiência.

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Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13964.htm

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Este artigo foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de uma fonte e teve a curadoria de Fábio Vieira Figueiredo. Advogado e executivo com 20 anos de experiência em Direito, Educação e Negócios. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP, possui especializações em gestão de projetos, marketing, contratos e empreendedorismo. CEO da IURE DIGITAL, cofundador da Escola de Direito da Galícia Educação e ocupou cargos estratégicos como Presidente do Conselho de Administração da Galícia e Conselheiro na Legale Educacional S.A.. Atuou em grandes organizações como Damásio Educacional S.A., Saraiva, Rede Luiz Flávio Gomes, Cogna e Ânima Educação S.A., onde foi cofundador e CEO da EBRADI, Diretor Executivo da HSM University e Diretor de Crescimento das escolas digitais e pós-graduação. Professor universitário e autor de mais de 100 obras jurídicas, é referência em Direito, Gestão e Empreendedorismo, conectando expertise jurídica à visão estratégica para liderar negócios inovadores e sustentáveis.

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